domingo, 13 de março de 2011

Lapinha-Tabuleiro debaixo d'água

Mesmo tenho já feito duas vezes a clássica travessia Lapinha-Tabuleiro, as duas ida e volta, ainda me encanto por aquelas bandas. Então, juntamos alguns animados para enfrentar a chuvarada e fazer novamente essa pernada. Com uma diferença: dessa vez, passando pelo Pico do Breu e acampando no cume no primeiro dia.

Um grupo que inicialmente seria de 8 pessoas, acabou somente com 3 integrantes:
  • Pat e Jorge são chiques demais e foram passar o Carnaval no Chile (trabalhando)
  • Flavinha teve que ficar cuidando da Mimosa que apareceu na última hora com uma infecção no útero

A travessia Lapinha-Tabuleiro é a mais clássica de Minas Gerais e uma das mais clássicas do Brasil. É uma pernada relativamente fácil, com poucos desníveis grandes, e muita caminhada no pé da serra. Ela inicia no vilarejo da Lapinha da Serra, a 10 km de Santana do Riacho e termina na famosa cachoeira de Tabuleiro, com seus 273 metros de queda livre e visual impressionante. Há 2 pontos principais de acampamento na travessia que são a casa da Dona Ana Benta (a 4 horas de caminhada da Lapinha) e a casa da Dona Maria (a 1 hora e meia de caminhada da cachoeira de Tabuleiro). Existe ainda uma variante da travessia, bem menos frequentada, que passa pelo cume do Pico do Breu, ponto culminante da Serra do Cipó, e desce pela sua ingreme encosta para reencontrar a trilha original bem próximo à prainha, no rio Parauninha. Esse caminho agrega dificuldade, tanto em navegação (não há trilhas marcadas) quanto em desnível, e beleza à caminhada, e é por lá que eu queria ir dessa vez.

Pico do Breu - 1679m

A previsão do tempo dizia:
  • Sábado - tempo chuvoso (15mm)
  • Domingo - tempo chuvoso (39mm)
  • Segunda - tempo fechado com períodos de melhoria (2mm)
  • Terça - tempo fechado com períodos de melhoria (6mm)

Armados até os dentes com capas de chuva, anorak, calças impermeáveis e afins, ignoramos a previsão do tempo, e tocamos para a Lapinha.

Dia 1
No sábado de manhã, depois de pegar o Cristiano e o Willian que vieram de SP e Araraquara respectivamente, na rodoviária. A Flavinha foi com a gente para voltar para BH com o carro, e voltar na terça para nos buscar. Chegando na Lapinha, o tempo já estava bem fechado, com muitas nuvens carregadas. Começamos a caminhada às 13, e meia hora depois já colocamos os anoraks para nos proteger de uma chuva fina.


Contornamos a serra logo em frente ao vilarejo, e fomos em frente rumo ao Pico do Breu. O grande problema foi que a partir de um certo ponto, não havia trilha marcada. Fomos tentando nos guiar pelo GPS, e acabamos enfrentando a maior das roubadas do feriado. O GPS nos dizia para subir uma cachoeira de pedras para continuar na trilha. Decidimos seguir em frente com a esperança de que encontraríamos a trilha novamente mais a frente, mas não deu certo. Fomos obrigados a escalar um pedaço de uns 10 metros da serra, para atingir um grande descampado, e a partir daí correr atrás da trilha novamente.


Depois de umas duas horas de sobes e desces, muitos erros de trilha, e visibilidade de menos de 15 metros, "sem querer" nos demos conta de que estávamos no cume do benedito do Pico do Breu. Dessa vez o GPS valeu o seu preço, pois sem ele, provavelmente ainda estaríamos lá procurando o caminho, já que a navegação visual era praticamente zero. Armamos acampamento bem no cume, e às 18:30 já estávamos em nossas barracas, preparando o jantar. O mestre cuca Cristiano fez uma bela gororóba com linguiça calabresa e queijo parmesão, enquanto eu testava a tal comida liofilizada. Às 20:00 eu já estava apagado na barraca, bem cansado da bela pernada em baixo de chuva. De madrugada, da-lhe chuva!

Dia 2
Acordamos por volta das 8 da manhã, e fomos presenteados com 10 minutos de tempo aberto, que foram suficientes para termos uma linda vista do vale abaixo do Pico do Breu.


Cristiano e Willian fizeram um belo capuccino com chocolate alpino, e começamos a levantar acampamento em meio a uma chuva bem fina. Bem perdidos pela falta de visibilidade do dia anterior, identificamos o caminho de descida do pico e o ponto aonde interceptaríamos a trilha original, e com as mochilas nas costas começamos a descida da encosta do Breu. Duas horas de uma bela descida, com uma chuva intermitente na cabeça, deixaram os joelhos um pouco doloridos, mas o visual compensou. Sem trilha marcada novamente, mas com o tempo com menos neblina, conseguimos seguir mais ou menos a indicação do GPS, escolhendo os melhores pontos para atravessar os riachos de água que desciam da montanha.


descida pela encosta do Breu
Pico do Breu visto da prainha
Chegamos então à prainha do Parauninha, e o próximo passo era atravessá-lo. O que antigamente era um caminho de pedras em meio a um riozinho calmo e raso, se tornou um belo rio de 1 metro e tanto de produndidade. Comemos algo, e naquele frio, guardamos as roupas e atravessamos o rio com as mochilas acima da cabeça.
Continuamos então a trilha do outro lado do rio, que agora já se tornava bem mais plana, com uma chuva fina que não parava. Seguimos o pé da serra por mais uma hora e meia, atravessando alguns riachos com água nos joelhos, até a subida que nos levou à estradinha de terra. A quantidade de água que caía da serra era impressionante. Para todo lado que olhávamos, havia uma cachoeira por entre as pedras.



Cruzamos a porteira e continuamos a leve descida ainda debaixo de chuva, até a casa da Dona Maria. Chegamos lá debaixo de uma forte neblina, tomamos um fantástico banho quente, cozinhamos mais um jantar, e às 20:30 eu já estava novamente apagado na barraca. De madrugada, pra não perder o costume, dá-lhe chuva!

Dia 3
Acordamos com a esperança de uma melhora no tempo (prometida pela previsão), e demos de cara novamente com uma forte neblina e chuva fina. Deixamos as barracas e mochilas lá mesmo (com a esperança de que o tempo iria melhorar e secar a barraca), e fomos em direção a parte de cima da cachoeira de tabuleiro somente com uma mochila de ataque. Como sempre, debaixo de chuva e névoa.

Quase 2 horas depois, chegamos na entrada do canyon que dá acesso à boca da cachoeira. Chegando lá, fiquei impressionado com a quantidade de água que descia. Esta foi a sétima vez que fui à parte de cima da cachoeira de Tabuleiro, e nunca tinha vista nada parecido com aquilo.


Como não daria para entrarmos no canyon, fomos em direção ao paredão de pedra, por cima, para conseguir uma vista da cachoeira. Neste momento, o tempo deu uma trégua, e depois de uns 10 minutos por uma trilha marcada, tivemos uma vista privilegiada da cachoeira. Um mundaréu de água caindo a 270 metros de altura. Realmente impressionante! O volume de água só fez deixar a cachoeira mais bonita ainda, com duas grandes colunas de água que desciam toda a extensão da queda até tocar o poço.

Cachoeira de Tabuleiro
Ficamos por algumas dezenas de minutos apreciando a queda, aproveitando o tempo bom. Pegamos então a trilha de volta, e após 15 minutos o tempo já estava fechado de novo, com chuva fina e forte névoa. Chegamos de volta na casa da Dona Maria por volta das 13:00, desmontamos as barracas, arrumamos novamente a mochila e nos preparamos para pegar a trilha de volta. Conhecemos lá o Marquinhos, neto do seu Zé de onze anos de idade. Muito curioso, nos perguntando sobre as mochilas  e equipamentos, dei de presente pra ele um mosquetão pêra que carregava na mochila, com a dívida de que ele teria que aprender a usá-lo. O Willian ainda deu pra ele um chaveiro com uma lanterninha de LED que o deixou todo animado. Comemos algumas bananas (algumas maduras outras nem tanto) gentilmente oferecidas pelo Seu Zé, e pegamos o caminho de volta.

Marquinhos, neto da dona Maria
Pra variar, caiu uma bela chuva no caminho que durou até chegarmos próximo à porteira da estradinha de terra. E aí, quem resolveu dar o ar da graça? Depois de três dias cinzas, o Sol resolveu aparecer. Paramos num riozinho pra comer e ficamos batendo papo aproveitando o calor do sol e o tempo aberto.




Vista dos Três Irmãos
Continuamos a trilha com tempo bom, e depois de descermos a serra, sugeri que continuássemos caminhando e acampássemos depois do Rio Parauninha, ao invés de parar na Dona Ana Benta. Atravessamos o rio novamente com água no peito, e continuamos a caminhada no escuro, aproveitando o bom tempo e a temperatura bem agradável. Chegamos no ponto de acampamento às 20:00, que ficava perto do curral de pedra. Armamos as barracas, e em meio a muitos mosquitos, formigas e uma aranha que perseguia a minha barraca, fizemos mais um belo jantar (com direito a linguiça calabresa, queijo parmesão e salaminho) e fomos dormir.

Dia 4
Só pra não perder o costume, choveu bastante durante toda a noite. No entanto, para nossa sorte, a terça-feira amanheceu com tempo nublado mas bem seco. Arrumamos novamente as mochilas, e pegamos a trilha para o trecho final de caminhada.



Num passo bem rápido, subimos e descemos a serra, e após 2 horas estávamos no vilarejo da Lapinha. Enquanto esperávamos a Flavinha chegar com o carro para nos buscar, passamos ainda num restaurante próximo ao Cruzeiro, e comemos um excelente prato feito, com filet mignon e champignon, e uma cervejinha porque ninguém é de ferro.



Resumindo, foram 4 dias e 52km de muita chuva e muito perrengue, mas de visuais incríveis e muito bom humor. O Cristiano e o Willian foram parceirassos, e por isso as decisões difíceis que precisamos tomar se tornaram bem mais fáceis dentro do bom senso de cada um, e da preocupação com a segurança.

Apesar de tudo, foi uma travessia incrível, aproveitada em cada instante pelos diversos percauços que não nos deixavam esquecer o quão pequenos somos diante das montanhas e da natureza.

Agora é só deixar tudo secando durante uma semana pelo menos, e estamos prontos para a próxima.... Hehe...

Pontos altos do feriado:
  • Flavinha pegou estrada de terra sozinha pela primeira vez... E não caiu em nenhum mata-burro!
  • Anorak novo do Rafa quebrou um galhasso com a chuvarada toda
  • O Capuccino com chocolate alpino do Cristiano entrou para a lista de melhores cafés da manhã na montanha do Brasil
  • Comemoramos o aniversário do Willian e o dia internacional das mulheres (coincidência??) no último dia de caminhada
  • Vamos ter que provar o açaí liofilizado, porque o sorvete liofilizado que prometia muito foi um fracasso

Frangos presentes:
  • Rafa
  • Cristiano (broua)
  • Willian (rrródddinha)

2 comentários:

  1. Bão dimais da conta sô!
    Valeu pela matéria, fotos e por valorizar a comunidade principalmete Dona Maria e Sr Zé.
    Como é maravilhoso perigoso o quintal da nossa casa em dias de chuvas.
    Estão convidados a tomar um café aqui no Tabuleiro e conhecer a nossa arvore gameleira com mais de 300 anos.
    Forte abraço a todos e muitas aventuras em 2011.
    Inté, Samuel
    Pousada Gameleira
    www.pousadadagameleira.com.br

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  2. Amigos,

    Muito bom o blog de voces, estou examinando com calma, parabéns pelas aventuras e alegria,

    abs,

    Nilson Soares

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